terça-feira, 10 de agosto de 2010

O nome da rosa - Der name der rose

O enredo do filme de Jean-Jacques Annaud, baseado no livro homônimo de Umberto Eco, é ideal para os que gostam de histórias de detetive, por seguir a técnica tão bem desenvolvida por nomes como Edgar Alan Poe e Sir Arthur Conan Doyle. A diferença é que aqui os crimes ocorrem em 1327 e o cenário é um mosteiro italiano.

Semelhante a Auguste Dupin de Poe ou o mais conhecido Sherlock Holmes de Conan Doyle, Sean Connery interpreta o franciscano William de Baskerville, auxiliado por Adso Von Melk, interpretado por Christian Slater. A dupla chega ao mosteiro a princípio para um conclave, mas se deparam com uma série de assassinatos, que muitos monges atribuem ao demônio. Ao longo do filme fica polarizada a rivalidade entre a razão, utilizada por William para tentar desvendar quem é o assassino, e a fé, também utilizada e manipulada pelo assassino – que não será citado aqui para não estragar a surpresa de ninguém – para que todos acreditem que as mortes em série sejam obra do demônio, lembrando que a história se passa no século XIV, quando a igreja católica utilizava a inquisição para queimar supostos feiticeiros.

Além dos detetives que guiam a trama como em vários outros filmes, tem outro ponto extremamente contemporâneo na obra que faz a ligação entre o mosteiro e a época atual, apesar dos sete séculos de diferença. A característica tão marcante no período medieval e que, evidentemente com outras formas, perdura até hoje é o controle de informação. Sempre relacionado ao poder, o saber nas mãos de poucos permite a manipulação de muitos, por isso sempre foi de interesse dos poderosos restringir o acesso a vários tipos de informação.

Evidentemente era muito mais fácil controlar a informação há sete séculos, antes da imprensa, com os livros copiados manualmente, a grande maioria da população analfabeta e crente nos castigos divinos. Porém a tentativa de manter a população pouco instruída ainda é bastante frequente através de medidas que podem ser extremamente diretas ou mais sutis, com resultado em longo prazo. Os governos podem aplicar censura aos meios de comunicação, como infelizmente presenciamos cotidianamente, ou sucatear a educação da população para que aos poucos o senso crítico de cada um seja minimizado. É triste notar que os brasileiros conhecem as duas técnicas muito bem.

Historicamente a busca pelo conhecimento sempre ofereceu resistência ao controle de informações, que muitas vezes tem até o efeito contrário de instigar a vontade de saber, como muito bem trabalhado por Michel Foucault na obra “História da sexualidade”. Com o desenvolvimento dos meios de comunicação e a internet pulverizando informações em tempo real o trabalho dos que se empenham em barrar o conhecimento é mais difícil, mas ainda assim avançam as tentativas de bloqueios de sites e controle de acessos, pouco diferente dos monges da idade média que trancavam bibliotecas e envenenavam páginas de livros para matar quem se atrevesse a tentar lê-los.

Existe a falsa desculpa de que alguns conteúdos são impróprios para determinados ambientes ou para algumas idades. Digo falsa, pois ainda que de fato sejam, a tentativa arcaica de interdição ao acesso está longe de ser a melhor opção – exatamente por instigar a vontade de saber, citada acima. Certa vez presenciei um pai queixando-se de que a filha adolescente começava a dar trabalho por querer ler livros inadequados para sua idade, que ele proibia, e ao ser orientado de que este procedimento só poderia fazer com que a garota buscasse o conteúdo por outras formas e que o ideal seria ler os livros e discutir seu conteúdo abertamente com a filha, o pai negou alegando não ter tempo para ler. Este é o comportamento típico da igreja de sete séculos atrás, ou seja, recorrer à interdição e à punição – em caso de desobediência – ao invés de reconhecer os benefícios de pessoas instruídas trabalhando em conjunto.

Uma boa pedida para os fãs de cinema, com enredo atrativo, ótimas interpretações, belas fotografias, mas que acaba nos obrigando a baixar a cabeça e assumir que, apesar do fim da inquisição, a busca pelo controle cego de informações continua bastante presente, tal qual há muitos séculos.


O filme é de 1986, eu não encontrei nenhum trailer legendado.

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